O anúncio do deputado Jim Clyburn deixou a campanha de Bernie Sanders apreensiva.
No final de fevereiro, o parlamentar da Carolina do Sul, considerado a maior liderança negra do Congresso americano, afirmou que apoiaria o ex-vice-presidente Joe Biden à Casa Branca.
Auxiliares do senador progressista viram na declaração o início do movimento mais importante das primárias democratas até aqui.
Desacreditado após resultados frustrantes em Iowa, New Hampshire e Nevada, Biden venceu de forma arrebatadora na Carolina do Sul, fidelizou o eleitorado negro a sua candidatura e em três dias ressurgiu como a principal aposta do partido para concorrer contra Donald Trump.
Ancorado no voto dos negros, o ex-vice de Barack Obama apostou todas as fichas para se consolidar como a alternativa a Sanders e rapidamente uniu o centro democrata em uma articulação bem montada que começou com a desistência de Pete Buttigieg e Amy Klobuchar, às vésperas da Super Terça, e desaguou nesta quarta (4), com a saída de Michael Bloomberg da disputa.
Depois de gastar mais de US$ 700 milhões para estrear no dia mais importante das primárias, o ex-prefeito de Nova York ganhou somente no território de Samoa Americana, que estava em jogo ao lado de outros 14 estados.
Juntos, eles somavam 1.344 dos 3.979 delegados que vão à convenção nacional do partido, em julho, escolher o candidato à Presidência dos EUA. Mas Bloomberg conseguiu apenas 12 deles.
Assim como Buttigieg e Klobuchar, o bilionário e ex-prefeito de Nova York declarou apoio a Biden após anunciar que suspendia sua campanha, afirmando que permanecer candidato prejudicaria “o objetivo de vencer Trump.”
A decisão de Bloomberg se alinha ao desejo do establishment do partido.
Lideranças tradicionais da sigla temem que a agenda de justiça social e igualdade econômica de Sanders afaste eleitores moderados que, em 2018, ajudaram os democratas a recuperar maioria na Câmara e, assim, não seja capaz de superar Trump.
Figurões da legenda já se mostravam dispostos a se mexer para impedir a nomeação do progressista.
A forma mais simples de ganhar a indicação do partido é conseguir 1.991 dos 3.979 delegados durante as primárias de fevereiro a julho.
Mas, além deles, outros 771 superdelegados -governadores, integrantes do comitê nacional e do Congresso, por exemplo- podem entrar em ação caso nenhum candidato atinja o número mínimo e seja necessário realizar um segundo turno.
O jornal The New York Times, em reportagem publicada na semana passada, entrevistou 93 desses superdelegados e encontrou uma oposição fortíssima à indicação de Sanders.
Desde o início a campanha democrata é travada entre os campos progressista e moderado do partido, e a fragmentação do centro favorecia o senador por Vermont.
Ele teve bom desempenho nas primeiras prévias e chegou à Super Terça como líder em números de delegados e na média das pesquisas nacionais, mas a agilidade dos adversários o surpreendeu.
Os últimos três dias mostraram a volatilidade da disputa democrata, e ainda não é possível considerar o senador por Vermont fora do jogo.
Ele segue competitivo, com apoio de latinos e jovens pelo país, e tenta reorganizar sua campanha com novas peças publicitárias e um discurso mais assertivo contra Biden.
A liderança irreversível que o progressista queria consolidar nesta Super Terça, porém, foi por água abaixo, e agora ele deve lutar voto a voto com Biden até a convenção de julho, quando deve haver segundo turno para a escolha do nomeado.
Um dos principais desafios de Sanders é conseguir que Elizabeth Warren desista de concorrer e declare apoio a ele o quanto antes.
Em entrevista coletiva nesta quarta (4), ele disse que a democrata é uma excelente senadora com uma campanha forte. Acrescentou que ela está avaliando o que fazer e que é importante respeitar o tempo que levará para tomar uma decisão de como prosseguir na corrida.
Warren briga com o senador pela ala democrata mais à esquerda, mas não tem conseguido bom desempenho nas prévias e, nesta terça, perdeu inclusive em Massachussets, onde foi eleita senadora.
Biden levou este e pelo menos oito outros estados na Super Terça, sendo um deles o Texas, segundo mais relevante, com 228 delegados, e no qual Sanders liderava nas pesquisas.
O ex-vice-presidente somou assim 390 delegados até agora e assumiu a liderança na contagem.
Os novos apoios foram fundamentais para duas vitórias estratégicas de Biden: Amy Klobuchar, senadora por Minnesota, e Beto O’Rourke, do Texas, que desistiu de concorrer à Casa Branca ainda no ano passado.
O’Rourke não se identificava com o campo dos moderados e pegou analistas de surpresa ao declarar endosso a Biden nesta semana.
Já Sanders venceu em 4 dos 14 estados da Super Terça, um deles a Califórnia, mais importante região em jogo, com 415 delegados, e soma 330 delegados, segundo o New York Times.
Até a publicação deste texto, Maine era o único que ainda não havia projetado os seus resultados.
Com impulso da Carolina do Sul, o voto dos negros carregou Biden nos estados do sul americano que estavam em disputa na Super Terça.
Ele teve 66% desse eleitorado na Virgínia, 56% na Carolina do Norte, 70% no Alabama e 50% no Texas, por exemplo.
A vitória nos dois primeiros, moderados e considerados estados-pêndulo na eleição nacional, foi fundamental para Biden colocar à prova sua capacidade de formar uma base ampla contra Trump.
O argumento do ex-vice-presidente, escorado no establishment do partido, é que o senador não consegue atrair moderados e, sem eles, é impossível vencer o presidente e voltar à Casa Branca.
Sanders, por sua vez, foi sustentado principalmente pelo voto dos latinos: 46% desse nicho deram apoio a ele na Califórnia, 42% no Colorado e 39% no Texas, onde a eleição foi apertada.
O progressista ganhou delegados mesmo onde Biden venceu -e vice-versa-, pois teve desempenho acima de 15%, piso em cada estado para conseguir levar delegados proporcionalmente à votação.
Em 2016, os latinos foram uma das grandes fragilidades do senador.
Neste ano, sua campanha focou esse eleitorado e conseguiu formar com ele um muro favorável a Sanders na Costa Oeste do país.
Biden e Sanders emergem da Super Terça consolidados como os dois nomes da disputa democrata e, até a convenção de julho, precisam duelar pelo apoio daqueles que não estão dispostos a votar em qualquer nome para vencer Trump.
Enquanto o progressista tenta avançar sobre o eleitorado negro e mais velho nas próximas primárias, o ex-vice-presidente terá que atrair jovens e latinos.
Agora, os democratas entraram na fase do tudo ou nada para impedir a reeleição de Donald Trump.
Da Casa Branca, o presidente assiste à guerra da oposição apoiado na máquina do governo e nos índices econômicos que, mesmo com as ameaças de recessão global, ainda não recuaram de maneira significativa.
Fonte: Bahia Notícias