Presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), o ministro Luís Roberto Barroso reagiu nesta quinta-feira (9) aos discursos golpistas do presidente Jair Bolsonaro no 7 de Setembro.
Barroso abriu a sessão da corte eleitoral com duro discurso para rebater as acusações que o chefe do Executivo faz sobre o sistema eleitoral, além dos ataques pessoais a ele dirigidos pelo mandatário.
“Todas pessoas de bem sabem que não houve fraude e quem é o farsante nessa história”, afirmou Barroso. “Quando fracasso bate à porta, é preciso encontrar culpados.”
O ministro disse que “o populismo vive de arrumar inimigos para justificar o seu fiasco. Pode ser o comunismo, pode ser a imprensa, podem ser os tribunais”.
A atual crise institucional, patrocinada por Bolsonaro, teve início quando o presidente disse que as eleições de 2022 somente seriam realizadas com a implementação do sistema do voto impresso —essa proposta já foi derrubada pelo Congresso.
Em julho, em conversa com apoiadores, Bolsonaro disse que “a fraude está no TSE” e ainda atacou Barroso, a quem chamou de “idiota” e “imbecil”.
“Não tenho medo de eleições, entrego a faixa para quem ganhar, no voto auditável e confiável. Dessa forma [atual], corremos o risco de não termos eleição no ano que vem”, disse na ocasião.
Um dia antes, também ao falar com apoiadores, Bolsonaro havia feito uma ameaça semelhante: “Ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições”.
Já no discurso em São Paulo, no 7 de Setembro, Bolsonaro voltou a mirar o sistema eleitoral. “Não é uma pessoa que vai nos dizer que esse processo é seguro e confiável, porque não é”, afirmou. “Não posso participar de uma farsa como essa patrocinada ainda pelo presidente do TSE.”
Ainda no 7 de Setembro, ao escalar mais uma vez a crise institucional no país, ameaçar o STF (Supremo Tribunal Federal) e dizer que não cumprirá mais ordens judiciais do ministro Alexandre de Moraes, Bolsonaro cometeu crimes de responsabilidade que podem levar à abertura de processos de impeachment, segundo especialistas ouvidos pela reportagem.
Além dos crimes de responsabilidade, que possuem caráter político e jurídico, o presidente pode ter cometido também crimes comuns, ilícitos eleitorais e ato de improbidade administrativa, na avaliação de parte dos entrevistados.
O STF analisa atualmente cinco inquéritos que miram Bolsonaro, seus filhos ou apoiadores na área criminal. Já no TSE tramitam outras duas apurações que envolvem o chefe do Executivo.
Apesar de a maioria estar em curso há mais de um ano, essas investigações foram impulsionadas nas últimas semanas após a escalada nos ataques golpistas do chefe do Executivo a ministros das duas cortes e a uma série de acusações sem provas de fraude nas eleições.
Nesta quinta-feira, no início de sua fala, Barroso lembrou que o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Luiz Fux, se manifestou sobre os ataques àquela corte e seus integrantes.
Afirmou que, agora, caberia a ele, rebater o que presidente da República disse de inverídico em relação à Justiça Eleitotal. “Faço [isso] em nome dos milhares de juízes que servem à Justiça Eleitoral”, destacou ele, ao classificar a linguagem de Bolsonaro de abusiva e mentirosa.
“Já começa a ficar cansativo para o Brasil ter que repetidamente desmentir falsidades.”
Barroso disse que as eleições brasileiras são totalmente “limpas, democráticas e auditáveis”, e que nunca se documentou fraude. Lembrou que, pelo sistema eleitoral em vigor, foram eleitos Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva, Dima Rousseff e próprio Bolsonaro.
O magistrado frisou que há dez camadas de auditoria no sistema e comentou que contagem pública manual de votos é como abandonar o computador e regredir aos tempos da caneta tinteiro.
“Seria um retorno ao tempo da fraude e da manipulação. Se tentam invadir o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, imagine-se o que não fariam com as seções eleitorais.”
Em suas palavras finais, o presidente do TSE disse que insulto não é argumento e que ofensa não é coragem.
“A incivilidade é uma derrota do espírito. A falta de compostura nos envergonha perante o mundo. A marca Brasil sofre, nesse momento, uma desvalorização global. Somos vítimas de chacota e de desprezo mundial.”
TSE CRIA COMISSÃO SOBRE TRANSPARÊNCIA E SEGURANÇA NAS ELEIÇÕES
Após o discurso de Barroso, foi anunciada a criação de um órgão destinado a ampliar a transparência e a segurança de todas as etapas de preparação e realização das eleições.
A CTE (Comissão de Transparência das Eleições) foi instituída por meio de portaria publicada nesta quinta (9). A comissão contará com a participação de especialistas, representantes da sociedade civil e instituições públicas na fiscalização e auditoria do processo eleitoral.
Em outubro, com a presença de intengrantes da CTE, de presidentes de partidos políticos e dos ministros da Corte Eleitoral, será feita uma exposição sobre o sistema eletrônico de votação, além de visita à sala onde ficarão os códigos-fontes.
“Aqui não se faz nada às escondidas. É tudo transparente e aberto pelo bem da democracia brasileira”, afirmou Barroso.
Ataques ao sistema eleitoral e à urna eletrônica fazem parte da retórica do presidente Jair Bolsonaro desde a campanha. Na véspera do pleito, em outubro de 2018, ele afirmou que só perderia se houvesse fraude. ?
“Isso só pode acontecer por fraude, não por voto, estou convencido”, disse em live em outubro de 2018.
As acusações infundadas se mantiveram mesmo depois de eleito. Em março de 2020, Bolsonaro disse que teria vencido a eleição ainda no primeiro turno, porém nunca apresentou nenhuma prova disso.
Até hoje, não há evidências de que tenham ocorrido fraudes em eleições com uso da urna eletrônica. A urna possui diferentes medidas de segurança e de auditoria.
Independentemente disso, há especialistas que defendem que o TSE deveria aumentar a transparência do sistema eleitoral e melhorar as possibilidades de auditoria das eleições. O problema, dizem eles, é que o debate técnico e sério acaba ofuscado pela desinformação e por mentiras.
Pesquisa Datafolha realizada de 8 a 10 de dezembro mostrou que 73% dos brasileiros defendem que o sistema de voto em urna eletrônica seja mantido. Já o voto em papel, abandonado nos anos 1990, tem sua volta pleiteada por 23% da população.
Do total de entrevistados, 69% disseram que confiam muito ou um pouco no sistema de urnas informatizadas, que passou a ser adotado gradualmente em 1996. Outros 29% responderam que não confiam.
Fonte: Bahia Notícias